"Somos anjos duma asa só e só podemos voar quando nos abraçamos uns aos outros."

Pensamento de Fernando Pessoa deixado para todos os que estão na lista abaixo e àqueles que passam sem deixar rasto. Seguimos juntos!

OS AMIGOS

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

OUTROS NATAIS...

Há medida que o tempo passa por nós, acumulamos vivências inesquecíveis que alguns degraus mais atrás nos fizeram crescer de tal forma, que as carregamos para sempre num cantinho especial.

Não sei precisar exactamente em que ano da minha vida se passou esta história, mas terá sido entre os meus 8/9 anos. Até tarde acreditei que era o menino Jesus que nos trazia os presentes e assim a cada natal crescia em mim a esperança, de que o Menino Jesus me presenteasse com aquilo que sabia ser impossível que os meus pais me dessem. Aproveitando essa oportunidade, todos os anos renovava os mesmos pedidos com veemência: uma boneca, ou um brinquedo mais apetecido que via nas mãos das amigas, sem ousar pedir uma bicicleta embora bem lá no fundo acalentasse essa esperança. Ao chegar o dia 24 de Dezembro repetíamos cuidadosamente a mesma rotina: pegávamos num sapatinho e posicionávamo-los todos em fila que nem montra de sapataria; o meu ficava sempre num lugarzinho especial por ser o mais pequeno.
Ia para a cama só quando era vencida pelo sono e pela manhã a ansiedade batia cá dentro como um despertador.Erguia-me num pulo, acordava as minhas irmãs e corríamos até à cozinha. A decepção era sempre igual: no sapatinho tínhamos sempre o chocolate que reconhecíamos ter sido dado pela mercearia onde nos abastecíamos, ou aquele tecido ofertado e guardado pela minha mãe para posteriormente nos fazer alguma roupa. Depois de refeita, esperava resignada o próximo natal.
Mas houve um natal diferente. Num ano tal como nos outros, também deixei o sapatinho à chaminé mas com uma esperança redobrada. A minha irmã Isabel com apenas 14 anos havia começado a trabalhar e depositou em mim uma alegria e esperança de que naquele natal o Menino Jesus iria de certeza passar à nossa casa. Essa noite de natal foi a mais longa de sempre. O sono foi entrecortado por insónias que deixavam em alerta todos os meus sentidos. Eu esperava a vinda do Menino Jesus. Numa dessas insónias ouvi passos, seguidos do resmalhar das prendas e o meu coração saltou de alegria: O menino Jesus estava ali, deixando algo nos nossos sapatinhos. Pregada à cama esperei a custo pela manhã. Mal raiou o dia, ainda cambaleante corri até à chaminé e os meus olhos arregalaram de assombro: os sapatinhos estavam tapados de prendas com lacinhos.  
Claro que não recebi a bicicleta, mas depressa a esqueci perante a visão dos nossos sapatinhos tão recheados. Naquele ano, a minha mana Isabel foi o “menino Jesus” do nosso natal.

Hoje recordo esta passagem com um sorriso e com muita gratidão pelo gesto de amor tão significante da minha irmã. Ela soube juntar os escudos e abdicar deles para me proporcionar um natal inesquecível.
Porém, há muito tempo que agradeço ao Menino Jesus os nossos natais. Não tínhamos prendas, nem televisão, nem jogos. A nossa casa era pequena, bastante simples e humilde e para nos alegrar, apenas uma telefonia que tocava na noite de natal até bem tarde ao compasso do garfo que batia na frigideira enquanto o meu pai fritava os pastéis. Pelo meio ficavam os passos de dança pavoneados do meu pai, que se dividia por todas as mulheres da casa e no final fazíamos a “adiafa”: um chazinho com os fritos e pastéis ainda quentinhos e polvilhados de açucar e canela.
Afinal o Menino Jesus esteve sempre presente nos nossos natais, dando-nos o maior presente que uma família pode receber: união, paz, amor e alegria.

Só para concluir: Aos 20 anos, já casada, o meu marido pegou em peças velhas e formou uma bonita bicicleta azul que de tão pesada me venceu de cansaço logo à primeira, mas que me fez muito feliz.

Dulce Gomes

11 comentários :

  1. Amiga Dulce,

    agradeço-a imensamente por essa parilha lindíssima,

    beijinhos no coração

    Gisele

    ResponderEliminar
  2. Dulce
    Como é bom partilhar os teus natais.

    Dá-me só um bocadinho da tua bicicleta...

    Foi lindo demais, consegui sentir o cheirinho da canela...espero que sim.
    E também essas irmãs tão queridas, e essa familia tão amiga e eu que tenho duas manas... e quantas vezes também esperei coisas tão belas e brinquedos tão lindos.

    Nada...
    Mas era Natal e a magia do Natal vale tudo o que há no mundo

    Só por si valia todos os brinquedos do mundo e as novenas do menino Jesus á noite, lindo demais...
    Obrigada por estes cinco minutos de Natal.
    Beijinhos da Utilia

    ResponderEliminar
  3. Amiga Dulce, que emoção! Que bela partilha.Confesso que me arrepiei. Eram os natais da época,como criança sonhava,mas tinha o seu Natal de Amor,o mesmo amor que tantas vezes hoje falta na abundância.

    Desejo um Santo e Feliz Natal, para as suas irmãs, sua filhota, marido,pai, toda a sua familia que lhe é querida. E um sapatinho especial para si,um saco cheio de saúde,para si e para os seus. Beijinhos natalicios.Zézinha C.

    ResponderEliminar
  4. Que maravilha de partilha...que sublime,tudo aqui relembrado...a mana e restante família...afinal eram Natais maravilhosos recheados do principal ... O Menino esteve sempre presente, nas palhinhas deitado.
    Grande consideração tenho por si.
    Ontem adorei ouvir D.Carlos Azevedo com a sua frontalidade que lhe é habitual...Jesus é assim...quer que sejamos assim...olhar o próximo e não fazer de conta... olhar de lado...porque incomóda .
    Se todas as famílias adoptassem dentro das possibilidades uma família carenciada...acabava de imediato a fome, as necessidades nas crianças...e as outras crianças que têm em demasia...aprendiam a repartir e ficavam desde pequeninos a conhecer JESUS nos seus coraçõezinhos.
    O Natal deverá ser em todos os dias das nossas vidas...para com o próximo.
    Bjs. e forte abraço
    Mer e família

    ResponderEliminar
  5. Que bom as suas amáveis palavras.
    Dão-me alento para continuar a minha caminhada... um pouco diferente...mas com a mesma finalidade e seguindo os mesmos princípios.
    «Todo aquele que fica preso apenas em uma religião formal torna-se incapaz de ver a acção de Deus no tempo presente, endurece o próprio coração e não reconhece nem a acção de Deus nem a sua presença no seu dia a dia.»
    Reflexão - Mt 21, 23-27

    O que mais me preocupa é um dia estar em presença DELE e não O reconhecer...por minha ignorância ou até minha conveniência...
    Bjs. com carinho
    Mer

    ResponderEliminar
  6. ai malandra que me fizeste vir as lágrimas aos olhos , e um nózinho na garganta .......
    amiga , são esses os natais mais bonitos para recordar né !!!
    obrigada pela partilha ,...

    mil beijocas ..

    ResponderEliminar
  7. Amiga Dulce, os seus natais eram parecidos com os meus... eu ainda não esqueci a desilusão de finalmente descobrir quem punha as prendas. Tinha 10 ou 11 anos e a minha irmã, mais velha do que eu 3 anos, disse-me que quem comprava era a minha mãe e que ia deixar de o fazer porque já éramos grandes, que até no Natal anterior tinham ido as duas à feira comprar as camisolas que nos "trouxera" o Menino Jesus, que até foi a minha irmã que escolheu... e então, nesse Natal já não recebi nada.
    Mas como me recusava a acreditar, pus o meu soco (era o calçado que eu mais usava, socos no inverno e chinelos no Verão) na sala da casa da minha avó (nos anos anteriores punha na casa da minha mãe) onde eu morava (foi ela que me criou) e rezei muito, pedi ao Menino que não permitisse que o que a minha irmão tinha dito fosse verdade... mas era.

    Beijinhos

    ResponderEliminar
  8. Olá Dulce,

    Lágrimas de emoção correram nos meus olhos ao ler a sua história.
    Eu também passei por situações parecidas, mas melembro com muita alegria no coração.

    Linda e profunda partilha.

    Obrigada pela visita no jardim no post em homenagem ao Roberto.

    A paz!

    ResponderEliminar
  9. Querida Dulce, linda história. Ela não me trouxe lágrimas aos olhos, como em Lucinha, mas trouxe-me risos ao ler o final da bicicleta azul! Seu problema era a biciceta e seu marido resolveu, embora não sendo lá aquela coisa que vc sonhava. Parabéns, linda amiga, além oceano. Adorei o seu post. Ah! Roubei o seu selinho de Blog Católico. Não resisti, pois queria um e o seu me encantou. Já era para eu ter te avisado, mas a cada comentário, fugia-me. Estou perdoada? Abração!

    ResponderEliminar
  10. Sabes uma coisa Dulce?

    Em cada vez que aqui venho, cá encontro (e sempre) o natal. Todos os dias aqui é natal.

    Deliciei-me a reler o poema na imagem de topo, agora aqui é que tinha que o dizer.

    Obrigada por isso.
    (shh.. e por 'aquela palavra' deixada no meu canto .. (tão querida...só tu eheh))

    Bjs, muitos!

    ResponderEliminar
  11. Ao ler esta postagem recordei os meus Natais com 6,7,8 anos que eram identicos.Chaminé caiada,fogão de petróleo limpo a solarina e a brilhar,um prato de filhós á espera do Menino,a cartinha no prequinho e a botinha á espera.Pensava não me ter portado bem, porque no outro dia de manhã, apenas tinha umas meinhas,uma sombrinha de chocolate
    e a bonequinha que há tanto pedia não aparecia.....mas a alegria era imensa e logo esquecia porque era Natal, e o importante era festejar junto com pais e irmã o nascimento do Menino que vinha para nos salvar......esse foi o melhor dos ensinamentos que os meus pais me deram .
    Obrigada por este momento da nossa infancia.
    Beijinhos Dulce e O espirito de Natal a acompanhe,com uma consoada de amor e calor familiar.
    Ana

    ResponderEliminar

As palavras de amizade e conforto podem ser curtas e sucintas, mas o seu eco é infindável.
Madre Teresa de Calcutá