"Somos anjos duma asa só e só podemos voar quando nos abraçamos uns aos outros."

Pensamento de Fernando Pessoa deixado para todos os que estão na lista abaixo e àqueles que passam sem deixar rasto. Seguimos juntos!

OS AMIGOS

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

SOPRO...




Acordei decidida a rabiscar na primeira folha em branco que me aparecesse pela frente. Viajei em busca duma ponta solta, algo que sobressaísse do novelo emaranhado de conteúdos que me abalroam e abrangem de forma tão absorvente.
Este processo fácil choca com o travão mental que funciona como uma triagem a tudo o que me paira por dentro e que – se eu permitir – se desprende e desliza na folha duma forma inata.
Mas travo. Corto as asas das minhas mãos e peço-lhes tréguas.
Este conflito provoca-me uma penumbra confusa que reduz o meu intelecto a réstias dispersas que não se encaixam entre si.

A palavra rendição bate forte e trás impressa uma sensação amarga de derrota.
Estarei manipulando e mutilando as minhas asas refugiando-me por detrás da muralha da comodidade, por medo? 

AsasAsas de silêncio, de albatrozalma com asas… sempre asas: uma metáfora tão descritiva como palpável, por quantas vezes as minhas mãos são o voo da minha espiritualidade; arreigadas e insubmissas perante a minha pessoa, debatendo-se furiosamente contra o meu agachamento, repelindo o controlo que quero exercer sobre elas…
E quando me apercebo estou eu própria asfixiada no espaço que não lhes dou, sucumbindo ao meu próprio nó… pairando no vazio da desobediência, apenas por medo…
O receio de dar asas às minhas asas apavora-me. Porque me faz sair da minha concha protectora e me expõe; porque exige de mim coragem e capacidade de encaixe para saber lidar com o retorno dessa exposição e fico vulnerável perante a análise que possa ser feita à minha pessoa.
No entanto cá dentro, algo me diz que a ordem é para folgar o cordel do meu voo e deixar-me embalar ao sabor dos ventos que sopram, rumo: Até onde queres que vá!?...

Dulce Gomes

Pedindo a luz para um decisão. Senhor, ilumina as minhas decisões.


sábado, 28 de janeiro de 2012

PISTA DE LUZ


Em toda a encruzilhada há sempre uma pista de luz que foge aos mais desatentos.
Há que procura-la para além do olhar baço; Para lá da penumbra pardacenta do fraco entendimento; Para lá do curto horizonte a que nos impomos como limite.
Não há impossíveis para quem – verdadeiramente – crê.
Há que rasgar a bandeira desfraldada da nossa rendição e avançar…
Avançar para a Luz que dá a vida e que existe para além do que o nosso olhar vê.
Luz intensa, forte,
Capaz de varrer para longe os despojos da nossa inacção; Capaz de exterminar o marasmo e o medo que nos alberga; Capaz de nos traçar o rumo, soprando-nos em Sua direcção. 
Transformando o curso da nossa encruzilhada num só caminho de chão firme, nossa verdadeira estrada.
E se alguma força violenta nos atentar, seja a Cruz de Cristo o nosso escudo. A pista de Luz que nunca devemos subestimar...

Dulce Gomes

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

EQUAÇÃO


A felicidade
Não nos grita ao ouvido
Numa fonética perfeita e previsível
Soprando o sonho que se almeja
Como se estivesse de antemão definido…
Não é uma equação aritmética extensível
Onde se ligam parcelas de passos perfeitos
Nascem ambíguos, tortos, indecisos
Resultantes de trilhos nem sempre direitos.
Dividem, quando queremos multiplicar
Subtraem contrariando o nosso somar
E nesta adição
O resultado é uma previsão
Da qual não temos o dom de adivinhar…

Dulce Gomes

Este poema vai direitinho para uma pessoa que eu amo muito...

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

DO PROVÉRBIO 3, 1-12



Senhor
Que não se afastem os meus olhos
Dos teus preceitos
E se agrave cá dentro esta busca
De Te querer conhecer.
Ata como adorno ao meu peito
O sentido da Tua palavra
Ainda que nem sempre a consiga entender…
Que nas Tuas veredas, examines
Se o meu rasto pisa o chão do Teu caminho.
És bom Pai.
Se acaso me perder
Aceito a Tua correcção
E o meu coração será celeiro e lagar
Que se encherá de trigo
E transbordará de bom vinho

Dulce Gomes
Do provérbio 3, 1-12

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

OLHAR O MAR...


Olhar o mar…
É deixar que ele desenhe com precisão os traços da minha vida. Escutar o marulhar das ondas, das ventanias e o encadeado dos mares de leva em tempos de maresias…
Olhar o mar…
É transportar-me ao céu nas asas duma gaivota, perder-me na bruma, poisar no revelim e de respiração suspensa escutar o som profundo do seu bater nas rochas enegrecidas, enquanto os barcos de pesca assomando na linha do horizonte, traziam o sustento, que calavam os silenciosos lamentos das misérias de tantas vidas…
Olhar o mar…
É fechar os olhos e repisar a praia onde cresci, sentir o ranger da areia fina debaixo dos pés e rever as pegadas diminutas de uma simples e vulgar menina. Corria, bebendo o vento da alegria como se fosse uma estrela-do-mar beijando os recantos mais profundos do seu mundo. E só parava, quando perdia o pé no vaivém da alta maré, onde uma mão forte, calejada pelos ventos do norte, a segurava.
Olhar o mar…
É sorver o cheiro a bolachinha americana,  batata frita, a bola de Berlim, sabores inconfundíveis e tão tatuados num mar de recordações sem fim.
É lembrar a exactidão com que contava cada tostão bem arrecadado numa velhinha carteira, comprada a muito custo numa banca da feira. E de mãos cheias, este pedacinho de gente, atravessava a areia quente em bicos-de-pés e aterrava na toalha pesada de tão molhada , saboreando o sol e o sal do mar a cada dentada.
Olhar o mar…
Faz-me sentir grata, abençoada e de bem com a vida. 
Neste mar estão as marcas das minhas tempestades dissolvidas. Em cada onda batida leio histórias presas às minhas memórias sem espaço, tempo ou idade.
E um dia, quando os meus pés já não alcançarem a areia fina; quando encalhar a gasta carcaça em qualquer canto, sei que correrei de novo como menina, e navegarei até encontrar o mesmo mar que me fez sonhar e ser feliz, mas também se misturou, tantas vezes, com o sal do meu pranto.

Dulce Gomes

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

PALAVRAS À TOA...



Solto as palavras à toa…
E por tempo indefinido pairam no branco imaculado da folha como um borrão disforme, sem encaixe nem compreensão…
Fogem de dentro de mim num perene sentimento que tem tanto de calmo e agitado, como de luz e escuridão.
As trevas do que não sei cerram as cortinas dos meus olhos.
Não alcanço, não vejo, só sinto.
Neste confronto aberto – quase surreal – vagueio pelas frases desconexas que almejo entender e rendo-me tantas vezes à evidência de nada ter e pouco ser…
Magoa a impotência que se alonga e engrandece à medida que reduz a minha insistência a um mero esforço que aos poucos perece.
E só quando exausta quase rendida, encosto à margem; Quando o deserto me faz tropeçar nas fendas ressequidas dos seus trilhos;Quando despida de raciocínio me aprisiono e me abandono ao rosto amargo do declínio, aceitando o fim da viagem…
Tudo acontece...
Cheira a terra molhada, a tapete de sementes vivificadas, a fragrância a lírios do campo, de mar em plena maresia.
Ante esta energia arrepia-me a alma…e sou tanto…
Acorrento-me à luz do entendimento que me agita, definindo o sentido.
E os sóis – meus faróis – tecem bordados reluzentes soprando ao meu ouvido…
Os meus dedos espezinhados balançam frenéticos de confiança. Ignorando as cicatrizes dançam agora felizes traçando um rasto de esperança.
E das palavras à toa a ferro e fogo lavradas
Permanece a certeza tão boa
De que elas são o “TUDO” 
Dos meus insignificantes "nadas"


Dulce Gomes


quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

REAGIR E AGIR...

Entre a tomada de consciência de algo e o agir quanto tempo levamos a reagir?
Às vezes demasiado tempo. Tanto que sem darmos conta estamos a falhar, caindo aos pés da nossa inércia, da nossa cobardia, das nossas incertezas; achando que se não existe um s.o.s. declarado, tudo está dentro dos parâmetros que definimos como aceitáveis; e deixamos para amanhã, para os outros, ou até para o tempo – como se ele fosse o remédio para tudo – aquilo que nos compete como membros de família, como amigos, ou nem que seja só pelo facto de nos inserirmos numa sociedade conjunta onde interagimos uns com os outros. 

E quando assim é, a nossa lentidão choca com a urgência do outro lado e dá-se uma reacção em cadeia que afecta ambos.
De um lado: o sabor amargo da nossa incúria que nos empurra e confronta com a verdade nua e incontestável da nossa negligência.
Do outro lado: o sabor triste e deprimente de quem anseia e espera por uma palavra, um afecto, um abraço para hoje e já esperava para “ontem” e não vislumbra no horizonte o mais pequeno sinal que o faça acreditar que vem a caminho algo capaz de suprir as suas carências e aumentar as suas forças, sejam elas de que ordem.

Só depois de passarmos à acção propriamente dita, nos damos conta do nosso atraso, ao ficar cara-a-cara com o peso e a dimensão do que nos cai nas mãos. Nesse momento, dói a decepção em relação à nossa pessoa  por não termos ido e tido a coragem, ou simplesmente a vontade de o fazer mais cedo.

Por vezes, andamos tão absorvidos com o mundo exterior que descuramos o nosso próprio mundo.
A todos os que fazem parte do meu “mundo”, que eu tanto amo e que aqui e ali possa ter negligenciado, peço perdão. Nem sempre os olho com o coração no exacto momento em que deveria agir.


Dulce Gomes

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

ÉS TU, SENHOR?



Quem me rasga o silêncio?
És Tu Senhor?
Calei para Te escutar
E não perscruto o mais ínfimo rumor…
Estás aí Senhor?
Serás este descompasso
Acelerando a minha alma?
Serás a serena mudez
Que acolhe a minha pequenez
Numa doce e saborosa calma?
Serás a madrugada
Onde me firmo e entardeço?
Serás a cor da minha alma cinzelada
E o Autor desta transformação
Que reconheço…
Só podes ser Tu, Senhor.
Este fogo de amor que me inflama
Ao qual todo o meu ser, se rende
Numa entrega que me sossega
Tão intensa que me reacende.
És Tu, Senhor!
Que numa enxurrada silenciosa
Despejas no meu coração
Palavras, gotas de luz e vida
Caindo embriagadas na minha mão.
Sei que és Tu, Senhor!

Dulce Gomes
(Uma grande amiga fotografada pelo nosso amigo João Craveira. Obrigada a ambos) 

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

SENTADA NO DEGRAU...

Por opção, fechei-me um pouco na minha concha desde o Advento. Resisti quase por completo ao apelo da escrita e tentei abster-me de opinar ou intervir de forma directa no mundo que me rodeia.
O objectivo? Reduzir ao máximo o meu "eu" para que Deus se revelasse e crescesse mais em mim.
Sentada no "degrau" onde estaquei, surgiram questões e crises existenciais; inquiri-me quanto à veracidade do que sou enquanto cristã e receptora da Luz que me alimenta o espírito; e naturalmente ressurgiu e ganhou espaço a velha contenda sobre o que faço neste meio vasto e por vezes hostil que é a internet. Tento perceber se Jesus ainda conta comigo aqui, já que em paralelo, me abre a outros horizontes onde vislumbro carências profundas duma realidade que dói mas estimula pelo facto de poder contribuir com o pouco que sou e tenho, para suprir as mesmas.

Reconheço a enorme mutação que jesus operou no meu interior. Coloriu a minha vida cinzelada com focos incisivos de luz que me apontam o caminho; encheu-me de objectivos, dotando-me com atributos que não tinha e/ou desconhecia para os poder desafiar e vencer; Fez-me acreditar que conta comigo para dar testemunho dessa mesma Luz. E eu acredito!
Acredito que embora frágil, fortaleço quando alguém me pede um abraço; acredito que mesmo caída, me ergo quando levanto alguém; Acredito que, ainda que as minhas palavras sequem, a Palavra há-de jorrar através do imenso amor que Jesus derrama entre nós. Todas estas “jóias” são o reflexo da Luz de Deus sobre o meu caminho.
Pouco me reconheço dentro dos parâmetros que me regiam e essa mutação trouxe-me mais responsabilidade para com os que me rodeiam, mas principalmente perante Deus. Esse cuidado faz-me repensar e examinar cada passo para me certificar e perscrutar se todos eles têm impresso o cunho de Deus. Porque de nada vale professar a fé com palavras escritas ou faladas, se elas não forem cimentadas com atitudes que as complementem.
Neste inicio de ano peço ao Senhor que nos faça cada vez mais, testemunhas da Sua Luz e da Sua verdade.

Dulce Gomes