Hoje foi mais dia de voluntariado na Capelinha do Lar e como sempre e está estipulado, depois do terço, dividimo-nos em cada semana pelos três anexos do mesmo para assim tentarmos chegar junto de todos e levar um pouco de nós. Este pouco, vai desde a oração, à escuta, à ajuda espiritual e até ao momento musical: cantorias - improvisadas ou não – onde nem falta um fadinho cantado pela minha irmã Isabel.
Na hora do terço soubemos pelo marido duma senhora que está acamada e que costumamos visitar, que ela estava vestida e à nossa espera para a levarmos para a salinha onde costumamos reunir-nos, ansiosa para estar presente. O problema é que hoje não era o dia daquele anexo e esperavam-nos noutro lugar…
Pensativas, nenhuma de nós conseguia sair dali e deixá-la de mãos vazias. Fomos ao quarto da senhora - o marido ao lado - e encontramo-la deitada na cama mas toda arranjada como se fosse para uma festa. Dissemos-lhe que não poderíamos ficar...
Ela, resignada, disse que não fazia mal, só queria ouvir cantar o fado da “Montanha Azul” que havia escutado do seu quarto, mas ao longe, num dos dias em que lá fomos.
Instintivamente, rodeámos a sua cama e de mãos dadas a minha irmã soltou a voz…
Ela fitou o infinito, como que, para absorver todo e qualquer pedacinho do que estava recebendo; o seu olhar espelhava um brilho renascido; a sua expressão era luminosa e o sorriso contagiante. Deixámos escorregar a emoção e deslizámos noutras canções de louvor e graças...
Saímos sem palavras, impregnadas pelo momento e percorremos a distância que nos separa até ao outro anexo quase em silêncio.
Quais as palavras adequadas para soltar nestes momentos? Não existem por mais que as procuremos.
Quebramos o silêncio à chegada, quando fomos acolhidas pelos abraços e beijos de saudade, pelas palavras de carinho de todos os que nos esperavam. E aí, adiámos a interiorização de tudo o que trouxemos e recomeçámos de novo a dar, a receber e a encher ainda mais a nossa "taça", que hoje transbordou de tantas graças recebidas e que nos empurrou montanha acima, bem mais perto do azul do céu.
Dulce Gomes